7.4.10

O Cavalo de Tróia




Se existisse um Jardim do Éden em Portugal, esse seria sem dúvida a baía da cidade de Setúbal. Não há sítio algum no Algarve, na costa alentejana ou mesmo na região Oeste do nosso país capaz de rivalizar com os recursos naturais que nos oferece a Península de Tróia, o Parque Natural da Arrábida e o Estuário do Sado. Não fosse o Homem, e estaríamos perante um paraíso único no mundo. Afirmo isto sem qualquer pudor, mesmo sendo natural de Setúbal, pois tenho a certeza que quem já visitou a região partilha da minha opinião.
Acontece que, aquilo é bonito sem artifícios, sem betão e sem mega-construções mas, desde as décadas de 60/70 que certos investidores teimam em fazer das areias de Tróia um destino turístico de massas, e para isso, levou-se a cabo um projecto denominado Torralta em que se construiram um conjunto de torres (enormes e cinzentas) que acabaram por se tornar no maior lar de morcegos do país.
Sempre me habituei a ver aqueles mamarrachos ali. E sempre os vi abandonados. Ao longe até dava a impressão de serem arranha-céus naquela planície arenosa, tipo Miami, mas de perto, eram mostrengos.
Uma dessas torres foi orgulhosamente implodida pelo Sócrates, com direito a transmissão televisiva e a festividades no outro lado do rio. Eu próprio vi a explosão a partir de um miradouro. O problema seria o que vinha a seguir. Casinos, hotéis, piscinas, marina, apartamentos de luxo. Afinal iam mesmo roubar a praia predilecta das gentes da terra. Até os velhinhos ferry-boats foram substituídos por uns extremamente verdes, e por um catamarã com plasmas embutidos. O grupo Sonae com o Rei Belmiro Midas a encabeçar a troupe, parecia estar na rota do sucesso mas em troca de um preço muito caro para a paisagem natural. Já não bastava a cimenteira em plena área protegida e o estaleiro naval em local de nidificação de flamingos, agora um mega-complexo renascido das cinzas. O único lado positivo de tudo isto seria o aumento de empregos temporários (durante a construção) e a abertura de vagas permanentes quando tudo estivesse pronto, no distrito que é o mais afectado pelo desemprego. Contudo, ontem li esta notícia, que me fez esboçar um ligeiro sorriso. Afinal parece que o cavalo do Belmiro é feito de pau-oco e que as areias de Tróia são terreno movediço.

6 comments:

  1. Quero que a Troia volte a pertencer ao povo.

    Hoje em dia tenho desgosto de chegar a Tróia e nao ver aquele predio engolido pela areia com que tanto gozei quanto mal tinha idade para perceber o quao estupido aquilo era.

    Ainda assim, se tudo correr bem, é óbvio que para Setúbal é bom que haja uma Marina e um casino em Tróia, vai certamente atrair turistas que a antiga Tróia ja nao atraia.

    Por mais cépticos que sejamos temos que aceitar que os tempos mudam e se nao nos adaptarmos as mudancas acabamos por ficar para tras (há melhor exemplo que Portugal no seu todo?).

    O grande mal do ser humano (principalmente o portugues) é nunca estar contente. Espero que num futuro próximo a nossa geracao e as proximas consigam mudar isso.

    Um grande VIVA á mais bonita baía de Portugal.

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  2. Sim, para a cidade e a própria economia regional é bom. Aliás, é uma lufada de ar fresco. Mas se nos abstrairmos do factor dinheiro, e se nos concentrarmos apenas nos recursos que a Terra (planeta) nos deu, podemos encarar todas aquelas construções e implosões como um atentado à natureza.
    Temos o exemplo do Algarve, que gere milhões de euros todos os anos, mas cujo mar teima em destruir. Na Costa da Caparica aconteceu o mesmo. E receio que a costa alentejana venha a sofrer do mesmo mal. É certo que hoje é bonito. Mas e daqui a 30 anos? O que irão ver os nossos filhos? Mamarrachos como eu vi? Temo que sim...

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  3. Infelizmente o dinheiro fala sempre mais alto. Um bom exemplo da selvajaria capitalista é o Parque das Nações.
    Quantas pessoas compraram apartamentos com promessas de que teriam vista para o rio e, pimba, espetaram-lhes com mais prédios à frente! Uma selva de pedra que, na minha opinião, o parque debaixo da ponte vasco da gama nao consegue compensar.
    Já troia não posso falar muito. Nunca lá fui. Que vergonha, pah...

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  4. Adoro Tróia, a Península de Setúbal e Sesimbra que é logo ali ao lado mas que tem aquele cancro que é a cimenteira.
    Quando ainda €podia€ muitos eram os passeios que ia ai fazer com a Iana.
    A nossa praia de eleição era em Tróia. Não ao pé do Cais mas sim uma deserta que fica a seguir ao Golf (de quem vai do cais é a primeira, e julgo que única, curva antes da recta para a Soltróia e Grândola.
    Em Setúbal ia lá várias vezes comer o choco frito mas isso já é um clichet :)
    A boa Tróia não é a dos casinos e dos hotéis mas sim a dos passeios em família com os farnéis onde não falta o rissol e o pastel de bacalhau.
    É à povinho mas há coisas que sendo do povinho têm mais sabor.

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  5. Sim, conheço bem o sítio a que te referes. Cheguei a ir para lá à noite pescar, cana espetada na areia e muita cerveja. Normalmente não pescava nada, mas era pelo evento e pela companhia. Sinto falta disso. E ainda me lembro bem quando ia a família inteira, o fogareiro e as sardinhas (e os salgados). Tenho muitas fotografias a brincar com a areia, completamente nu, dos tempos que ainda podia andar assim :P

    É por isso que sou tão reticente em relação a estes projectos megalómanos. Eles que brinquem lá no Allgarve ao turismo para ingleses...

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  6. A última vez que lá fui foi há 2 anos.
    O caminho para essa praia estava destruído por causa das obras.
    Há 3 anos aquilo ainda estava um espectáculo mas já não se podia andar nu, que eu experimentei e não se podia. :P
    Estou a brincar, eu percebi-te.;)

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